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CINEBLOG

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Crítica: Three Billboards Outside Ebbing, Missouri. A revolta também é um direito

 

Three Billboards Outside Ebbing, Missouri

Desde o momento em que vemos o olhar de Mildred (Frances McDormand) a inspecionar aqueles três cartazes decrépitos à beira da estrada, que sabemos o que se está a passar. Mildred é raiva, injustiça e sobretudo impotência. Está tudo espelhado naqueles olhos. É como começar uma história pelo fim, só que ainda estamos apenas no início. O que se segue é apenas uma confirmação.

Na terceira longa-metragem como realizador, Martin McDonagh aventura-se no território dos irmãos Coen e leva-nos numa viagem até à America profunda. Estão lá as armas, a violência, a misoginia e o racismo, que servem de combustível a uma reflexão sobre o luto e o direito a não deixar o passado cair no esquecimento, por muito inconveniente que possa ser.

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Crítica: The Disaster Artist. O desastre perfeito

The Disaster Artist

Quando se escreve sobre filmes biográficos, é lugar-comum usar expressões como "a realidade é mais estranha do que a ficção" ou "se não existisse, teria de ser inventado". Perdoem-me desde já a falta de originalidade, mas não encontro melhor forma de descrever tanto The Disaster Artist como o próprio Tommy Wiseau, o excêntrico auteur, interpretado de forma brilhante por James Franco.

De um modo geral, podemos dizer que The Disaster Artist é um filme sobre os bastidores do The Room, obra de culto ultra-independente que nos últimos anos tem ocupado confortavelmente o trono do sub-género "tão mau que é bom".

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Crítica: It Comes at Night. A noite é escura e cheia de horrores

It Comes at Night

Ao deambular pelo quadro de Brueghel nos minutos iniciais, It Comes at Night empurra a sua mensagem para outros limites. Nesse momento, o apocalipse deixa de ser a alegoria catapultada para a fama por Romero e torna-se numa viagem especulativa até aos medos e paranoias da europa do século XIV. Não é por acaso que a infeção retratada no filme é em tudo semelhante aos relatos da Peste Negra, a doença que dizimou um quarto da população europeia da altura. É muito fácil esquecermo-nos que tudo aquilo já aconteceu e que não há ninguém que nos possa garantir que não volte a acontecer.

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Crítica: Star Wars - The Last Jedi. Este não é o Star Wars de que estavam à procura

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Talvez o maior elogio que podemos fazer a The Last Jedi é que, contra todas as expetativas, e apesar de levar às costas todo o peso do mundo, consegue surpreender e inovar.

Desde o início do filme que Rian Johnson assume uma postura de autoconsciência e de desconstrução daquilo que significa o Star Wars. Tornou-se óbvio que já não estamos nos anos 70 ou até mesmo nos 2000. A internet tornou-se uma ferramenta essencial da militância Star Wars e Johnson, com a plena consciência disso, usa-a a favor de uma narrativa que se adivinhava previsível. 

Rian Johnson brinca, ou melhor, trolla a malta da internet e deita por terra todas as teorias rebuscadas e as análises frame a frame dos trailers. É uma espécie de sucessão espiritual do I love you/I know, atualizando-o e ampliando-o a toda a narrativa. Todos os mistérios que foram sendo criados e alimentados pela fanbase durante os últimos anos são resolvidos de forma inesperada, aproximando mais este capítulo ao Return of the Jedi do que ao Empire Strikes Back.

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Crítica: Alien Covenant. Sangue e filosofia

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O franchise Alien é tanto uma série de filmes sobre um bicho com duas bocas que mata gente, como Night of The Living Dead e respetivas sequelas são filmes sobre mortos devoradores de cérebros. O bicho interessa, claro: é inegavelmente uma criatura fascinante, que representa ao mesmo tempo o medo e a atração pelo desconhecido. Mas mais do que o fim em si mesmo, é o elemento ao redor do qual se exploram e desenvolvem outros géneros. 

Alien: Covenant é a sequela mais ou menos direta de Prometheus, provavelmente o capítulo mais ambicioso de toda a saga. O filme de 2012 levou a mitologia da série a todo um novo patamar, levantando questões, apontando caminhos e sussurando respostas. 

Aviso à navegação: embora tenha tentado fugir às revelações desnecessárias, torna-se difícil falar de alguns aspetos de Alien: Covenant e de Prometheus sem referir factos que podem ser considerados spoilers. Avancem à cautela.

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Crítica: "Get Out" (2017)

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Aquilo que mais me impressionou em "Get Out", obra primogénita do até agora comediante Jordan Peele (digo até agora porque a partir deste momento todos vamos olhar para ele com outros olhos), foi o facto de, apesar dos pequenos problemas estruturais e do ambiente marcadamente surreal, é um filme habitado por gente a sério. Não há decisões idiotas nem falsas dúvidas dramáticas. Os personagens agem, falam e raciocinam como qualquer um dos espetadores, e isso, num género em que é tão fácil cair em lugares comuns, é de louvar.

No entanto, essa é precisamente a razão que está por detrás do seu principal problema. "Get Out" é incapaz de aguentar o mistério muito tempo. Simplesmente não o poderia fazer sem sacrificar a sua metódica lógica interna e a credibilidade dos personagens. 

Ao tentar reproduzir uma estrutura talhada para um episódio clássico da "Twilight Zone" (30 minutos) num filme de quase duas horas, acaba por criar desequilibrios inevitáveis. Temos um primeiro ato e um payoff curtos e eficazes que contrastam com o recheio demasiado massudo do segundo ato, sobretudo se tivermos em conta que a solução do mistério torna-se óbvia logo no início do ato, tanto para nós como para os personagens. Isso leva a que grande parte do filme acabe por servir apenas para aprofundar a crítica social de uma forma demasiado óbvia e panfletária.

Obviamente que isso não retira os méritos ao seu realizador/argumentista, que consegue aqui um interessante thriller social (expressão usada pelo próprio) cuja mensagem, interpretações e mestria técnica são suficientemente fortes para aguentar a tensão, sem nunca precisar de recorrer a mecanismos de choque fácil como o gore ou o torture porn.

Que venha agora o próximo, senhor Peele.

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Crítica: "Rings" (2017)

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Vamos começar pelo fim porque também não há muito mais para dizer: "Rings" é mau. É bastante mau, aliás.

Nem vou falar dos atores e da forma como a protagonista se esfolava para tentar cuspir uma pronúncia americana decente. Nem sequer me vou preocupar com o crime que é desperdiçar o Vincent D'Onofrio numa bodega desta calibre.

Aquilo que me deixou à beira de uma crise de acne foi a forma descontraída, a roçar o insulto, com que nos tomaram por parvos. O segundo filme também não era grande coisa, mas pelo menos teve a decência de levar a sério o primeiro. Este nem isso consegue fazer. Afinal há mais vídeo dentro do vídeo. Porquê? Ora, porque não sabíamos como continuar a história, claro. Mas a Samara é uma vítima que quer ser salva? Ok, apesar do primeiro filme já ter dito que não, vou acreditar. Afinal não. Em que ficamos? Volta tudo ao mesmo.

A determinada altura, o filme até nos mostrou o caminho dos tijolos amarelos. Como funcionaria o vídeo na era das redes sociais e dos vídeos virais? Fazer uma cópia está a dois cliques do rato e desde que tenhamos amigos estamos a salvo. Mas que consequências a longo prazo teria isso? Até nos arranjou uma vedeta daquela série dos nerds para ficarmos contentes e tudo.

Mas tal como a Samara, também este conceito foi atirado para dentro de um poço onde ficou lentamente a afogar-se em litros clichés e sustos programados. No final, com um último esforço de braços, ainda conseguiu vir à tona e dizer as últimas palavras, mas já era tarde de mais.

E assim, meus amigos, é como se mata um franchise.

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Crítica: The Void (2016)

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Há duas coisas que nunca vão passar de moda: os anos 80 e os filmes de terror. Então se estivermos a falar de juntar as duas coisas, temos material capaz de sobreviver a duas extinções em massa.

"The Void" é um filme feito por quem cresceu a ver (e a adorar) os filmes de terror dos 80 e quer partilhar essa experiência com o mundo. Não é um filme original (nem o pretende ser) e as influências dos clássicos de Carpenter e companhia saltam imediatamente à vista.

Para tornar essa homenagem mais evidente, a dupla de realizadores Jeremy Gillespie e Steven Kostanski optou por abdicar quase por completo do CGI e abraçar os efeitos especiais "artesanais" (ainda não consegui arranjar uma tradução para a expressão "practical effects" que me convença). Isso, por si só, acaba por vender o filme e fazê-lo destacar-se entre as hordas de outros filmes que tentam ressuscitar a série B dos 70/80 mas que acabam por chocar de frente com o CGI manhoso dos 90. 

"The Void" é orgânico e old school e consegue transformar um defeito, que em tempos associávamos a produções baratas, num entranhável feitio.

As representações são competentes, a fotografia é bastante sólida (sobretudo se pensarmos que é quase tudo filmado à noite - ou pelo menos para parecer de noite) e é bom ver que ainda há quem faça filmes com 90 minutos.

Feitas as contas, o maior defeito acaba mesmo por ser o argumento, que tenta criar e desenvolver uma mitologia demasiado complexa para o curto espaço de tempo de que dispõe. Ficam algumas pontas soltas e demasiadas questões no ar, que, apesar de não serem suficientes para estragarem a experiência, acabam por torná-la menos eficaz.

Se sonham com o dia em que o Carpenter e o Clive Barker tenham um filho fecundado pelo próprio Cthulhu, não vão sair desapontados.

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