Na sequência do post de terça-feira, onde destilei, com relativa eficácia, o meu descontentamento sobre o estado lamentável a que chegaram os bilhetes de cinema, a Marina Aurora publicou na página de Facebook deste estaminé algumas fotos da sua coleção de canhotos.
São bilhetes com mais de 30 anos, que resistem estoicamente à inexorável erosão do tempo e aos próprios cinemas.
Estão a ver, pessoal da ZON ou qualquer outro cinema que tenha o hábito de entregar recibos do talho ao seus clientes? É disto que estava a falar.
Aqui ficam as fotos, com os respetivos comentários da autora.
"A "MINHA ESTRELA" a 1ª Mostra do Cinema Fantástico em 1981 no Carlos Alberto."
"Mais 2 Salas, também já desaparecidas do Porto, cujas cadeiras desciam quando nos sentávamos nelas, sendo que algumas, a certa altura, faziam uns ruídos que provocavam a gargalhada de muitos."
"O já "defunto" Pedro Cem" Sala extraordinária na Rua Júlio Dinis."
"E, para "Chatear" um conjunto dos muitos canhotos em meu poder e que religiosamente conservo, todos eles, no verso, referem o referido filme e com quem o fui ver! Excêntrica? Não sei, mas dava-me imenso gozo fazê-lo e agora sorrio ao recordar esses momentos."
E por último, como extra, aqui fica o bilhete que o Pedro, do inevitável CinemaXunga, publicou nos comentários ao post.
Numa altura em que Portugal atravessa uma conturbada fase política e social, é meu dever, como pessoa que escreve coisas na Internet, chamar à atenção para as questões realmente fraturantes da nossa sociedade.
Já muito se falou, e continua a falar, dos méritos técnicos e sociais de assistir a um filme numa sala de cinema. No entanto, há um aspeto que foi perdendo destaque ao longo dos anos, empurrado sem dó nem piedade para um recanto obscuro da nossa memória coletiva, e que está destinado a desvanecer-se no tempo, como lágrimas à chuva.
Lembram-se quando era possível guardar orgulhosamente, durante anos e anos, aquele diminuto mas simbólico pedaço de cartão que atestava que se esteve naquela sessão e que foi uma das experiências mais espetaculares de sempre? Lembram-se quando um simples bilhete significava mais que todas as cassetes de vídeo do mundo? Pois parece que esse pedaço de memória está reduzido a isto:
Recibo do talho que nos querem fazer passar por bilhete de cinema.
O que raio aconteceu ao bilhete de cinema?
Desde quando é que nos contentamos com um recibo do talho, mal impresso, que se apaga em pouco mais de um mês? Não estará já na hora de devolvermos ao bilhete de cinema a importância de outros tempos?
Se estamos a pagar por algo cuja única recordação física é um pedaço de papel, o mínimo que poderiam fazer era dar alguma dignidade a esse pedaço de papel.
Os espetadores de cinema deveriam ser mais do que um código de barras.