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CINEBLOG

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Vampiros? Claro que sim, mas só o suficiente para atrair a rapaziada EMO.

 

"Meu querido, não me digas que foste
outra vez roubar-me a base para a cara?"



Um amigo meu que muito prezo costuma dizer que a MTV vai acabar por fazer com o cinema aquilo que fez com a música. Eu não quero chegar tão longe - sou mais optimista em relação à espécie humana - mas infelizmente há muito de verdade nessa afirmação.

Sem ir mais longe, vou entrar no meu Delorean mental, recuar até aos últimos Óscares e focar-me naqueles que subiram ao palco: Zac Efron, Robert Pattison, Vanessa Hudgens. Grandes actores? Não. Grandes estrelas de cinema? Ainda não pelo menos. Ímanes de adolescentes? Sem dúvida.

Eles foram lá colocados porque alguém reparou que atraem um público facilmente impressionável, em pleno processo de formação da personalidade (ou seja, em busca de ídolos), consumidores compulsivos de merchandise e, acima de tudo, aquilo a que se pode chamar um "rebanho".

Melhor do que levar um cinéfilo solitário a sintonizar determinado programa, é convencer um grupo de adolescentes (que não querem por nada deste mundo perder o principal tema de conversa do dia seguinte no recreio) a fazê-lo.

"Twilight" obedece exactamente à mesma estratégia. Não se pode esperar que uma coisa seja algo que nunca teve intenções de ser. "Twilight", o filme, foi criado com um objectivo muito claro: pegar em todas aquelas adolescentes que ajudaram a Stephenie Meyer a comprar uma casa nova e trazê-las ao cinema.

 

A estória é simples: uma mortal, no auge da sua juventude, apaixona-se por um rapaz muito jeitosinho que tem o inconveniente de ser vampiro. Depois metem-se lá pelo meio uns vampiros maus, outros bons, uns colegas de liceu com as hormonas aos saltos e uma relação familiar mal explicada .

Ninguém parece querer saber da profundidade (ou da falta dela) de todos os personagens secundários (usar flashbacks em sépia tem tanto de cliché como de inútil) e parece que alguém na pós-produção se esqueceu de esconder os cabos que erguem os actores no ar.

Mas, para ser sincero, o que é que isso interessa? O que se quer é fornecer doses industriais daquele hiper-romantismo exacerbado tão típico da adolescência (nem faltou a câmara lenta no momento em que os olhares dos protagonistas de cruzam em campo-contracampo), um novo ídolo para as cachopas forrarem as paredes do quarto e uma estética videoclip com a qual se possam identificar.

"Twilight" é apenas isso. Um produto fraco com objectivos bem definidos. Alguém realmente estava à espera de mais?

 

P.S. A review chegou tarde mas chegou. Estou a ver se meto a casa em dia.

A cidade grita... e tem boas razões para isso.

 
"Sim, eu tenho uma gravata vermelha
e sei como usá-la"



Foi trucidado pela critica, arrasado pelos fãs de Eisner, escapou-se por uma unha negra aos Razzies (mais uma prova que aquilo não são prémios nem são nada), e se o Frank Miller (o ilustre autor de comic books e realizador deste filme) tivesse Twitter de certeza que teria perdido uma boa centena de followers. Mas será "The Spirit" assim tão mau?.

Eu gostaria de dizer que não. Gostaria de dizer que é uma das obras mais injustiçadas no que vai de século. Dava tudo por gostar deste filme, a sério que dava (aqui o dava tudo é apenas uma figura de retórica, não se ponham com ideias). Mas a verdade é que ... não tem ponta por onde se lhe pegue.

A minha primeira reacção ao ver o visual hiper-estilizado foi: "bem... deve ser uma espécie de "Sin City 2". Nada de muito original mas deve ter alguma qualidade, afinal de contas tem o dedo do mestre Miller.". Não podia estar mais enganado. "Sin City está para "The Spirit" como o "The Dark Knight" está para um qualquer episódio do Batman do Adam West.

Não, pior. O Batman do Adam West ainda tinha alguma piada e mantinha uma certa coerência. O guião de "The Spirit" oscila entre o neo-expressionismo noir levado ao extremo e a paródia simplória e grotesca. Tão depressa estamos a ouvir um monólogo pretensiosamente profundo sobre a sentido da vida, como a ver um Samuel L. Jackson vestido de Nazi a derreter um gato. Porquê? Talvez pela mesma razão que levou o personagem da Eva Mendes a fotocopiar o rabo e o The Spirit a achar que era uma prova policial perfeitamente válida.

No meio de tudo isto só tenho pena do Gabriel Macht. O moço mostrou qualidades e foi de longe o melhor de todo o filme. A Scarlett e a Eva só tiveram que aparecer - tarefa que, sejamos sinceros, não exige grandes índices de massa cinzenta. Em relação ao Samuel L. Jackson, esse está noutro campeonato. Pouco lhe importa se os filmes são maus ou bons. Ele vai ser sempre o maior.

Esperemos que isso também seja aplicável ao Frank Miller.

É esplendoroso, é imenso, é... insuficiente.

 

"Eu sabia que hoje não era um bom dia para vir às compras"
 

 


Imaginem-se no dia 24 de Dezembro às 23H59. À vossa frente, debaixo do pinheiro de Natal, amontoam-se umas belas e apetecíveis caixas embrulhadas em papel reluzente e adornadas com uns laços pomposamente penteados. Ao lado encontra-se uma modesta caixa de pequenas dimensões com um embrulho perfeitamente banal. Obviamente que se vão sentir atraídos pelos embrulhos mais espalhafatosos. É natural. É humano.

Agora imaginem que nessas caixas tão grandiosas estão escondidos uns pares de meias horrendas. Há um minuto de glória em que aquelas meias poderiam ter sido um telemóvel de última geração e em que se imaginam a tirar fotografias com a nova câmara fotográfica de não-sei-quantos megapíxeis. Mas a verdade é que no minuto seguinte o embrulho vai ser rasgado e imediatamente esquecido e o que conta a partir daquele instante é o padrão horrível das meias.

Baz Luhrmann tem um jeito do caraças para fazer embrulhos. Isso é inegável. À primeira vista, em Australia tudo brilha mais do que o habitual. A fotografia, o guarda roupa, o elenco, tudo parece invocar uma epicidade de outros tempos. O realizador australiano quis transportar para a sua terra Natal a magia do cinema de outros tempos e não se poupou a esforços. Não é à toa que uma das músicas do Wizard of Oz é o leit motiv do filme, nem é a toa que a magia é uma entidade omnipresente ao longo da obra (chegando mesmo a resolver uma ou outra situação mais aguda).

Texto publicado na íntegra aqui.

 

Mais cego é quem não o quiser ver

 
"Robert Neville? Onde estás?"


A humanidade não presta. Não há volta a dar. Em 1995, o colosso José Saramago "deu à luz", em forma de livro, uma cruel e apocalíptica alegoria sobre a condição humana, pondo em evidência a espessura frágil do manto que separa a sociedade da selva. Inevitavelmente, como em qualquer boa reflexão, o manto rasga-se. O responsável? Aparentemente uma cegueira branca de origem desconhecida que começa a propagar-se misteriosamente pelos cidadãos de uma cidade fictícia (será?).

O "filho" de Saramago chamava-se "Ensaio sobre a Cegueira" e rapidamente ascendeu às prateleiras destinadas às grandes obras da literatura mundial. Todos conhecem o estilo literário de Saramago e, goste-se ou não, seja-se da elite ou apenas leitor casual, todos estão de acordo que não é uma escrita fácil de digerir. Períodos longos, pontuação irrequieta, inúmeros saltos narrativos e reflexivos. Tudo o que o cinema não está acostumado a ser.

Talvez por isso, Saramago nunca tenha querido prostituir o menino dos seus olhos. Com os chulos de Hollywood todo o cuidado é pouco. Os sacanas ainda eram capazes de transformar os cegos em zombies e a cegueira numa arma biológica lançada por extremistas asiáticos.

Mas Saramago lá decidiu deixar o seu filho sair de casa. De Hollywood até vinham nomes de confiança. Fernando Meirelles tinha levado a estética MTV para as favelas (e as favelas até aos Óscares), e Don McKeller parecia ser um competente homem dos mil ofícios.


Texto publicado na íntegra aqui.

Uma quantidade minúscula de consolo



Coisa a não fazer nº421: andar descalço no deserto
 
De há uns anos para cá que o cinema de espionagem tem um novo cânone. A hegemonia da pueril brincadeira hi-tech setentista de James Bond deu lugar às sóbrias e frias incursões de Bourne. O público tornou-se mais exigente e já não se contenta com gadgets surreais e vilões megalómanos.

James Bond teve que se actualizar. Teve que se tornar frio e credível (ou, pelo menos, minimamente credível) e deixar os gadgets de lado. "Casino Royale" marcou essa mudança. Os fãs gostaram, os novos públicos renderam-se a ele e estava assim reiniciado o mais antigo franchise de espionagem da história do cinema.

As coisas eram tão promissoras que os produtores (encabeçados, como vem sendo habitual, por Barbala Brocolli) resolveram fazer um forte investimento na credibilização do personagem. Contrataram assim Marc Forster - um dos realizadores mais promissores dos últimos tempos - e o oscarizado argumentista Paul Haggis ("Crash").

O resultado, no entanto, apesar de ser positivo, ficou aquém das expectativas. À primeira vista está tudo lá. O sangue, as perseguições, as moças jeitosas (aqui representadas por Gemma Arterton e pela inesgotável Olga Kurylenko) e as mesmas caras (Judi Dench, Giancarlo Giannini e Jeffrey Wright continuam a acompanhar Daniel Craig nesta segunda aventura como agente de sua majestade).

Publicado na íntegra aqui.

Tarantino com arroz e batatas



" Toma lá. E da próxima vez não te esqueças da tua em casa.
Nunca se sabe quando aparece alguém para enterrar"



É arriscado dizer que o futuro do cinema português deveria passar por mais obras como esta. Mas é um risco que vamos ter que correr.

"Arte de Roubar" é um filme incoerente, falado num idioma que não é a lingua natural de nenhum dos personagens e tem algumas das cenas de acção mais disparatadas do cinema nacional. Mas é por ser tão raro encontrar essas características no cinema nacional (e tamanho nível de descomprometimento) que é impossível deixar passar esta simpática obra ao lado.

Tendo como inspiração óbvia as obras de Tarantino e Robert Rodriguez, Leonel Vieira (autor de "Zona J" e para muitos o pai do cinema português malcriado e americanizado) juntou-se ao espanhol Roberto Santigo (El Penalti más largo del mundo) e a João Quadros para trazer para os ecrãs nacionais um buddy movie desmiolado onde a palavra trash está na ordem do dia.

Chico Silva e Fuentes são dois amigos de má vida (mas bons rapazes) que se vêem envolvidos num estranho enredo onde têm que enfrentar pseudo-zombies, fetiches mortais, anões agressivos e bandidos obcecados por portas que rangem. Isto tudo enquanto se passeiam pelas lezírias ribatejadas a bordo de um Buick.
 

Publicado na íntegra aqui.

Mais um filme francês com "Paris" no título


"Deixa ver se não me bloquearam o carro..."

 

Alguém contempla atentamente uma paisagem. Esse é provavelmente o plano mais repetido neste filme e não é por acaso que isso acontece. No novo filme de Cédric Klapisch (realizador de "L’ Auberge Espagnole" e "Les Poupés Russes") essa paisagem é o elemento central. Ela é a protagonista. Ela é Paris.

A capital francesa surge nesta obra como um organismo em movimento. Não é a Paris idílica, recheada de amantes e paixões perfeitas. É a Paris real, poluída e altamente industrializada. Aqui não foram feitos esforços para remover digitalmente o fumo das chaminés das fábricas nem os graffitis das paredes. Paris mexe-se e contorce-se ao sabor do tempo, enquanto os personagens vão desfilando no seu interior.

"Paris" é um filme mosaico por excelência e não tem medo de o assumir. Mas enquanto que muitos filmes do género se esforçam demasiado por ligar as várias estórias (o que acaba por resultar muitas vezes em situações forçadas e artificiais) Klapisch não investe muito tempo nisso. Um encontro casual na rua é muitas vezes suficiente. O objectivo não é o particular mas sim dar uma visão geral do que se passa na cidade. E se isso pode ser considerado como algo positivo, a verdade é que também é daí que resulta o maior problema do filme.

Ver texto na íntegra aqui.

Definitivamente, este não é para destruir


 
"Ei? Gravas-me o novo PES?"
 

 

Sabem como se costuma dizer: bom filho à casa torna. Neste caso, bons filhos. Depois do memorável "No Country for Old Men", os irmãos Coen regressam em grande forma ao delicioso e cruel humor negro que os celebrizou.

A última vez que vimos os Coen a tentar fazer algo do género foi em 2004 com o insípido e desapontante remake de "The LadyKillers", que levou a comunidade cinéfila a perguntar se os bons irmãos não teriam perdido o jeito para estas coisas. Felizmente, por agora, não parece haver razões para duvidar.

"Burn After Reading" é cruel (ou se não, vejamos o que o destino reservou ao mais pacífico e simpático dos personagens), é selvagem e moralmente pouco aceitável, mas… bolas tem um piadão.

Pode-se dizer que, com esta obra, os Coen criaram a definitiva ode ao absurdo e à paranóia de uma sociedade com sede de conspirações. Para isso deram vida a personagens absurdas e egoístas, atiraram-lhes algo que lhes desse uma oportunidade de viajar a um universo desconhecido, onde pudessem dar alguma emoção e condimento a uma existência invariavelmente monótona (as informações secretas actuam como típico MacGuffin que vai, invariavelmente, perdendo importância ao longo do filme) e sentaram-se a ver o destrutivo e inevitável desfecho.
 

Texto publicado na íntegra aqui.