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CINEBLOG

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The Hole (2009) de Joe Dante

Quando eu era uma pequena máquina devoradora de VHSs (no sentido figurado, claro), pensava que todos os filmes bons tinham sido feitos pelo Spielberg (e o adjetivo "bons" tem que se entender na ótica de um catraio de 8 ou 9 anos). Não havia Zemeckis, nem Donner, nem Dante. Só Spielberg. Muitos de vocês, agora, estão-se nas tintas para o Spielberg, mas o senhor nos anos 80 era Deus (pelo menos para um pré-adolescente que gostava de pipocas). Mas depois reparei que afinal o Back to the Future tinha sido realizado por um tipo com um nome estranho e fiquei confuso... E mais, afinal o Gremlins era de um tal Joe Dante.

Como eu era um puto de ideias fixas comecei a desenvolver uma teoria que só abandonei muitos anos depois (aliás... na realidade ainda não a abandonei totalmente). Eu não estava enganado. Tal como pensava, tudo tinha sido realizado pelo Spielberg. No entanto, para não se comprometer em caso de fracaso, o realizador de E.T. assinava os filmes mais arrojados com outros nomes. Por exemplo, Zemeckis era o Spielberg mais experimental, dos efeitos especiais e da ficção científica, enquando Joe Dante era o Spielberg mais negro (até porque Joe Dante é um nome demasiado cool para ser verdadeiro)

À medida que os anos 90 iam avançando, os pseudónimos de Spielberg começaram a perder força (ou a virar-se para a animação esquisita) até ninguém se lembrar deles. Qual não foi o meu espanto quando, ao passar pelo cinema, reparei que Joe Dante tinha regressado (a última vez que Dante se aventurou nos cinemas foi com um esquecível filme dos Looney Tunes, em 2003). Como até tinha acabado de levantar dinheiro, resolvi aventurar-me.

A premissa é simples. Dois irmãos descobrem um buraco sem fundo na cave da casa nova (que talvez leve até ao inferno! Quem sabe!). Nos entretantos conhecem a vizinha nova (pela qual o irmão mais velho fica apanhadinho, pois claro) que os vai ajudar a desvendar o mistério. Obviamente que não é um filme perfeito. Tem uma série de buracos no argumento (se fazia tanto mal abrir o alçapão, porque que é que o antigo dono da casa deixou as chaves mesmo ao lado do dito cujo?) e recorre mais vezes do que era aconselhável aos inevitáveis clichés que já eram velhos há duas décadas e meio atrás. No entanto é um filme genuíno. As personagens estão bem construídas, as situações credíveis o suficiente, e consegue criar uma atmosfera própria, recheada daquele vibe dos anos 80, assustador mas ao mesmo tempo inocente.

O cinema evoluiu e com ele a linguagem cinematográfica. Ganharam-se umas coisas mas perderam-se outras. Em pleno século XXI perdeu-se a inocência sombria e ingenuidade do entretenimento "para toda a família" de outros tempos. Bem vindo de volta, Spielber... oops, Joe Dante.

 

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Sherlock Holmes: Lógica e explosões. O que poderia correr mal?

 
Sherlock Holmes de Guy Ricthie | 2009



Há uma técnica infalível que uso inconscientemente (ou nem tanto assim, ou não estaria aqui a falar dela) sempre que estou a pensar escrever sobre um filme e preciso de saber rapidamente se ele é bom ou mau (e como não vos quero chatear com cinzentos vamos pincelar os guilty pleasures de branco). Enquanto desço as escadas da sala de cinema, com os restos de pipocas alheias a estalar debaixo dos sapatos, pergunto-me em silêncio: seria capaz de ver isto outra vez amanhã? Acreditem que no ano passado poucos foram os filmes que receberam um "claro que sim" mais sincero do que este Sherlock Holmes.

Apesar de ser radicalmente diferente de todas as versões que adaptam a lendária criação de Conan Doyle, há na interpretação de Robert Downey Jr. uma proximidade assustadora à imagem mental que guardava de Sherlock Holmes que o torna no casting mais certeiro no que vai de milénio. Apesar da realização estridente - apanágio de Guy Ritchie - nunca duvidei que estivesse a assistir a uma aventura do detective de Baker Street.

É um filme de acção recheado de elementos steampunk, editado com a sofisticação caótica a que Ritchie nos habituou e admito que por vezes consegue ser bastante tonto. Mas não é em nenhum momento um filme estúpido e nunca chega a perder o norte. A acção é filmada com muita classe e o argumento tem a clareza e o sentido de humor necessários para transformar duas horas físicas em 15 minutos espirituais. Juntemos a isso uma dupla protagonistas que emana uma química surpreendente e um Mark Strong mais ameaçador que nunca e temos uma das experiências cinematográficas mais simpáticas do saudoso 2009.

 

Como diria um amigo meu: Guy Ritchie já nos deve duas sequelas. É bom que se apresse.

Paranormal Activity: quando um orçamento modesto parece demasiado

 
Paranormal Activity de Oran Peli | 2007



Há um plano bom em Paranormal Activity e Oran Peli sabe disso. Quando o realizador instala a câmara no quarto sabe que nos está a aprisionar. Não há movimento, não podemos fugir. Sabemos que alguma coisa vai acontecer e quer queiramos quer não vamos ser testemunhas de algo arrepiante. No entanto os conhecimentos que o realizador tem do género de terror ficam-se por esse plano e pelo conceito geral usado desde os primórdios da internet para pregar partidas: se mantiveres uma pessoa concentrada num ponto durante muito tempo e soltares o que quer que seja repentinamente ela vai apanhar o susto da sua vida.

 

O resto do filme é uma sucessão de clichés pré-históricos, diálogos sofríveis e situações pouco credíveis e completamente dispensáveis. Uma curta de cinco minutos com aquele plano fixo teria sido interessante. Como está, até os modestos 15 mil dólares de orçamento parecem demasiado.

Gamer: Simplesmente cansativo

 

Gamer de Mark Neveldine e Brian Taylor | 2009

 

"Daqui a alguns anos a contar deste preciso momento", os videojogos já eram. A indústria do entretimento digital resolveu apostar em avatares de carne e osso, e o passatempo da moda é um concurso onde prisioneiros condenados à morte são controlados remotamente por utilizadores sentados no conforto dos seus lares. Kables (Gerald Butler) é um dos infelizes avatares que está prestes a fazer história ao tornar-se na primeira pessoa a sair com vida do jogo. O problema é que o excêntrico criador do desafio (Dexter Morgan... perdão, Michael C. Hall) tem outros planos para ele.

Provavelmente devido ao crescimento das redes sociais, Hollywood escolheu 2009 para reflectir sobre o caminho sombrio que se pode abrir à nossa frente caso nos deixemos fascinar em demasia pelas sociedades virtuais. Há umas semanas era Surrogates a fazê-lo e agora é a vez dos criadores de Crank se debruçarem no assunto.

Mark Neveldine e Brian Taylor criaram uma sociedade decadente, insensível, onde tudo é permitido. Se por um lado temos a morte como forma de divertimento, por outro temos uma prostituição "encapotada" de uma sociedade (pouco) virtual. O filme funciona durante o primeiro terço onde a apresentação do universo é uma novidade, o problema vem depois. (...)

 

| Continua em Rascunho.iol.pt

Avatar: a revolução chegou-nos com uma alma clássica

 

Avatar de James Cameron | 2009


No virar de mais uma década, James Cameron resolveu reescrever a história da fundação dos Estados Unidos e dar novos contornos à luta entre colonizadores e indígenas. O conceito já foi reciclado por centenas de filmes e do ponto de vista visual, embora magnificamente executado, não é tão original como seria de esperar (pelo menos para os fãs de Final Fantasy - sim, o videojogo - e de Hayaho Myazaki).

A mitologia visual construída em redor de Pandora e dos Na'Vi pouco mais é do que uma conversão digital do universo fantástico com raízes nipónicas - alguém duvida que Cameron tenha visto e revisto a filmografia de Hayao Miyazaki, antes de meter mãos à obra?

Agora, a menos que estejamos a falar de plágio - o que não o caso - as influências não são necessariamente algo de mau. Nem todos podemos ter uma ideia original. O próprio Star Wars foi fortemente influenciado pelas epopeias clássicas (já para não falar de uma certa obra prima da literatura nacional).

Cameron pegou em todos estes elementos, reciclou-os e montou uma história de amor universal que se desenvolve num palco dominado por uma mensagem ecológica com uma reflexão sobre os valores da identidade, da tolerância e da partilha. (...)

 

 

| Texto publicado na íntegra em Rascunho.iol.pt

Ficção científica por procuração



No futuro a humanidade já não vai precisar de sair de casa. As tarefas do quotidiano (que vão desde aspirar a casa, ao sexo louco num beco escuro por detrás do local de diversão nocturna da moda) vão ser desempenhadas por duplos robóticos controlados remotamente pelos seus donos, confortavelmente instalados no conchego do seu lar. A criminalidade vai descer a números históricos, nunca mais ninguém se vai magoar e todos vão viver felizes para sempre. Pelo menos até ao dia em que alguém utilizar uma arma capaz de matar simultaneamente o «duplo» e o seu utilizador. A segurança da nação vai ameaçar o colapso e, de novo, ninguém vai estar seguro.

É desta forma que começa o mais recente thriller de ficção científica made in Hollywood. Está aberto o caminho para um enredo que segue a estrutura clássica da detective story à americana, com Bruce Willis no papel no investigador torturado pela perda de um filho.

Toda a narrativa de ficção científica decente é uma parábola que assenta numa extrapolação de um aspecto considerado quente na sociedade em que se insere. Neste caso a reflexão acontece em torno da web 2.0 e nos prejuízos que podem advir das chamadas redes sociais - são mais do que óbvias as semelhanças entre o mundo criado para Surrogates e a comunidade virtual Second Life.

 

Texto publicado na íntegra em Rascunho.iol.pt

Snake Plissken... com mamas



Em 2008 a Escócia é assolada por um vírus mortalmente eficaz. Para impedir que a vaga de infectados se alastre é construído um muro em redor do país de Sean Connery, deixando os locais entregues à sua sorte. Anos depois surge uma nova variante do vírus, desta feita em Londres e o facto de ainda existirem sobreviventes na Escócia leva a crer que foi encontrada uma cura. No entanto ela encontra-se dentro do território murado. A solução passa por enviar uma equipa de intervenção até ao outro lado do muro, liderada por esse despertador hormonal chamado Rhona Mitra.

Não precisamos de ler mais do que esta breve sinopse para algo nos começar a soar familiar. Somos imediatamente transportados para o univero cyber punk pós-apocalíptico (a ordem dos factores não altera o produto final) de filmes como Escape from L.A. ou Mad Max, que fizeram as delícias de quem teve a sorte de crescer nos loucos anos 80. Homenagem? Sem dúvida. E o realizador Neil Marshall é o primeiro a admitir.

Não há nada de mal numa boa homenagem. Aliás, é surpreendentemene honesto por parte de qualquer criador assumir as influências de forma tão flagrante (o que não faltam no mercado são cópias descaradas encapotadas de produtos originais). Ao assumir a homenagem (admitindo, no entanto, que existe um ponte diminuta a separar o reino da homenagem do império do plágio) um autor está a assumir publicamente uma paixão que o inspirou tanto artistica como culturalmente. O que eram afinal os projectos Kill Bill e Grindhouse senão uma gigantesca homenagem a um determinado género cinematográfico?

 

Texto publicado na íntegra aqui.

Wolverine de garras (pouco) afiadas

 

Alguém precisa de ligar urgentemente para a linha SOS Manicure



Três capítulos e muitos mutantes depois, o pessoal da Fox não teve grandes dúvidas: o Wolverine foi o personagem mais mediático a sair das incursões cinematográficas de "X-Men". O seu sucesso foi tal que conseguiu transformar um australiano desconhecido numa das grandes estrelas de Hollywood. Portanto não é de admirar que o nosso amigo amargurado tenha sido o mutante escolhido para protagonizar o primeiro spin-off da saga.

"X-Men Origins: Wolverine" (ou "XMO:W" para facilitar a coisa) assumia-se como uma oportunidade única para explorar o passado de um dos personagens mais intrigantes da saga.

Infelizmente para os fãs (e amantes da sétima arte em geral), "XMO:W" está a anos luz de ser um grande filme. Tenho mesmo sérias dificuldades em considerá-lo como parte integrante da saga que Brian Singer iniciou em 1999.

Enquanto que os capítulos anteriores (principalmente "X-Men", "X-2") eram tematicamente ricos, com reflexões constantes ao papel das minorias e da exclusão social, "XMO:W" é um filme de acção "pura e dura", recheado de personagens planas, que vive unicamente do carisma do seu protagonista.

O guião é fraco ao ponto de se atrever a dismistificar um dos pilares do sucesso de Wolverine - o mistério criado e alimentado em redor da sua perda de memória - de forma apressada e flagrantemente insatisfatória. A profundidade dos personagens é nula e alguns dos mutantes que foram alvo de uma maior exposição durante a campanha publicitária (como o Gambit ou o Deadpool) aparecem em três ou quatro cenas, actuando unicamente como um chamariz comercial. Curiosamente até o próprio Wolverine parece subaproveitado.

No entanto, e apesar de tudo isto (e porque sou humano ergo incoerente), não posso deixar de simpatizar com "XMO:W". Em primeiro lugar, apesar da narrativa deficiente, acaba por revelar-se um produto de entretenimento eficaz, com algumas sequências de acção verdadeiramente originais - a contrastar com a cópia descarada que Ratner fez ao estilo de Singer.

E em segundo lugar, por nunca se ter assumido como o "Citizen Kane" de coisa nenhuma. Gavin Hood sempre conduziu as coisas de forma despretensiosa e honesta, o que numa altura em que todos os filmes de super-heróis querem ficar para história do cinema, é de louvar.

Dito isto, e respondendo aos desejos do povo, vamos ao ranking: "X-Men Origins: Wolverine" está longe do patamar de "X-Men" e "X-2" mas é ligeiramente superior (e aqui o "ligeiramente" é a palavra chave) ao sub-produto com que Brett Ratner nos brindou em 2006 ("X-Men: The Last Stand").